sábado, 18 de dezembro de 2010

Em Santiago - CH

Ontem em Mendoza, como não poderia deixar de fazer, tomei um bom vinho no almoço e jantar. De vinhos também não sou conhecedor, mas desde muito o meu paladar elegeu os tintos secos da uva Cabernet Sauvignon. Meus amigos, estava uma delícia. Acordei hoje revigorado e cheio de vontade de pegar a estrada.
Ainda sobre vinhos, eu acho que ir a Mendoza e não experimentá-los é igual a ir a Roma e não ver o Papa.
Hoje, como eu já estava desconfiado e comentei na postagem anterior, o dia amanheceu nublado. Tive que modificar a arrumação da minha mala em virtude de ter aposentado temporariamente o traje chuva/sauna.
Finalmente, conseguí começar a rodar por volta das 08:30h. O ar estava frio mas eu já tinha me preparado para a subida da montanha. Usei até as luvas inteiras, que por sinal mais atrapalharam do que ajudaram. O ar atravessava a malha e as minhas mãos ficaram bem frias, tendo até sentido câimbra na mão direita na subida da serra. Ainda na parte plana fiz uma foto do termômetro que marcava, se não me falha a memória, 17 graus centígrados. Eu estava bem agasalhado e só sentia frio nas mãos, nos pulsos e às vezes no pescoço. No alto da montanha o termômetro marcou 15 graus somente. Mas o vento gelado é de amargar. E isso tudo com bom tempo pois as nuvens ficaram lá para o lado de Mendoza. A subida do lado argentino não tem nada de especial, a não ser a vista da cordilheira. Você roda fácil a 80km. e até mais em muitos trechos. Existem muitos túneis dos dois lados da fronteira, sendo que os do lado argentina são mais interessantes pois foram perfurados na rocha. E são vários, mais de dez. São túneis, na sua maioria de pequena extensão. Ia eu tranquilamente aproveitando o passeio quando entrei no penúltimo tunel do lado argentino. Tomei um enorme susto. Quase borrei nas calças. Por causa do vento frio eu vinha com a viseira totalmente fechada e ela não estava translúcida como de costume por causa da poeira do caminho. Entrei a não mais de 50km. pois na passagem de todos eu sempre reduzia a velocidade. Só que nesse não havia iluminação alguma. Derrepente,
eu que vinha de um ambiente ensolarado fiquei totalmente cego. E não podia soltar o guidon para abrir a viseira. Procurei diminuir a velocidade mais ainda, mas sem parar, e justamente por isso o equilíbrio, no escuro, começa a ficar vacilante. Andei escrevendo na pista por bons mentros e pedindo a Deus, é verdade, o que eu pensei com muita intensidade foi: Deus que me perdoe! E o infeliz do túnel ainda por cima era em uma leve curvartura. Depois de percorrer não sei que distância nesse sufoco, comecei a ver uma leve claridade, que em   pouco revelou-se como a iluminação de uma carreta que vinha em sentido contrário. Tenho a impressão de que tirei um fino dela porque o motorista ainda businou. Depois desse veio o último do lado argentino, mas sem maiores deficiências.
À saída do último túnel do lado argentino o leito da estrada novamente é substituído por aquela espécie de brita zero que eu já havia mencionado. E todo esburacado. A única vantagem é que você só toma poeira de um, podendo aumentar um pouco a distância entre ele e você, porque todos tem que seguir em fila.
Aí, meus amigos, começa a hora do pesadêlo. As aduanas Argentina e Chilena funcionam no mesmo prédio, no mesmo salão, lado a lado, com guichês alternados. Dezenas ou até centenas de pessoas, como um formigueiro, tentando encontrar os caminhos. Eu tive alguma sorte porque aquele casal de Recife, que eu havia tido o prazer de conhecer anteriormente, havia chegado antes de mim e já percorrido a Via Crucis. Viram quando eu cheguei, mais perdido do que cego em tiroteio, e vieram me dar as dicas, entregando-me inclusive alguns dos formulários que eu teria que preencher. Eles seguiram viagem e combinamos nos encontrar no primeiro posto que fica a 25km. depois das aduanas. Mas não deu. Eles devem ter ficado cansados de esperar e fizeram bem em prosseguir a viagem. Enquanto isso, eu lá nas aduanas. Depois de enfrentar a fila na aduana argentina para conseguir o visto de saída, entrei na fila da aduana do Chile para conferir toda a documentação já apresentada aos argentinos e então conseguir o visto de entrada no Chile, mas isso depois de preencher outro formulário. Daí, fui para outra fila para conferir todos os documentos novamente e ganhar mais dois que terei que apresentar na aduana quando for sair do Chile. Feito isso, tive que ir fazer câmbio, inclusive para poder pagar, lá mesmo, o pedágio de 800 pesos chilenos. Fiz o câmbio e já tive que reprogramar o meu velho e usado computador cerebral para entender a moeda chilena. É complicado. Pensam que acabou? Não acabou não. Com os dois documentos que terão que ser apresentados na saída do País,, voltei para onde a moto estava estacionada, totalmente coberta de poeira levantada pelas carretas e ônibus de turismo que iam sendo liberados antes de mim, para ser efetuada a fiscalização, inclusive com a conferência das informações constantes do formulário. Não é que fui sorteado para ter uma fiscal que, depois de perguntar se eu levava comida ou quaisquer alimentos perecíveis, inclusive alguma muda de planta, resolveu examinar toda a minha bagagem. Me deu a maior mão de obra. No final, como não poderia deixar de ser, disse que estava tudo em ordem, que eu poderia seguir, mas teria que apresentar um dos dois documentos na barreira, há uns cem metros adiante, para receber o último carimbo.
Quanta burocracia...E dizem que o Mercosul foi criado para simplificar as coisas. Imaginem como deveria ser antes, então.
Daí para a frente mais alguns quilômetros de brita e poeira, até que a estrada ficou ótima. Era o início da descida do lado chileno. Espetacular. Por mais que eu tente descrever não conseguirei transmitir a sensação sentida nessa descida. A estrada é muito boa e bem demarcada. Só que não há margem para erro. Erro no singular, porque se errar, já era. Curvas fechadíssimas que as carretas, tanto na subida quanto na descida fazem a uns 15 ou 20km. por hora. Na descida então, devido ao enorme peso que carregam, não podem bobear porque se embalar não há freio que consiga parar. De quando em quando há uma espécie de estrada secundária para emergências na descida. Essas emergenciais tem uns cem ou cento e cinquenta metros e são em subida. Se a carreta perde os freios é dirigida para lá para perder velocidade e entrar numa área de areia, para tentar ajudar na frenagem. Enquanto eu via as placas anunciando 100 metros estrada auxiliar, ou 200 metros, tudo bem. Mas em uma placa estava escrito - 2.000 metros estrada auxiliar. Estranho, né?
Gelo, só em alguns picos. E pouco. Vocês verão pelas fotos que postarei amanhã, porque o relógio já marca 01:06h. do dia 19 e eu preciso descansar. Hoje, domingo, ficarei em Santiago e vou aproveitar o dia para rodar pela cidade. Segunda pretendo seguir rumo ao sul.
Mas antes de encerrar, algumas palavras sôbre os comentários postados e sobre a pegadinha.
Para a Tatiana, minha gurú, digo que continuarei, na medida do possível, postando mais fotos.
Para o Maciel, tenho a dizer que fiquei satisfeito, antes de tudo pela sua sinceridade dizendo que não acreditava que esse meu projeto pudesse se concretizar. Ok, Maciel, obrigado pelas suas palavras e se possível continue nos acompanhando. A você, repito o que disse no início para todos aqueles que quisessem me dar o prazer de sua presença: podem comentar, podem sugerir, podem criticar ou somente me acompanhar. Hoje digo mais. A presença de todos vocês através dos comentários, faz com que eu procure transmitir com a maior clareza e fidelidade tudo o que ocorre no dia a dia. Além de, principalmente, diminuir a distância física que nos separa. Tenho certeza de que qualquer um de vocês, se tivessem oportunidade, fariam o que estou fazendo até melhor. Coragem é uma coisa estranha e totalmente subjetiva. Creio que ao atingir certa idade o homem já adquiriu alguma experiência e pode avaliar o risco de seus projetos com mais objetividade. É verdade que a alguns falta o entusiasmo para tentar concretizá-los. Esses são os que desistem de tudo passando a levar uma vida rotineira e sem graça. Daí aparecem a tristeza, o desânimo e a indiferença pela vida. É o caminho sendo percorrido rapidamente para o túmulo. Outros como eu, tem a vontade verdadeira de poder realizar ainda algum sonho antes da partida. E o prazer que vem daí é imenso. Por gentileza, pare de me tratar de Sr.. Somos motociclistas e entre nós não há diferença de idade. Só a física, que não tem maior importância. Existem rapazes que tem o espírito de idosos e idosos que tem o de rapazes. O nosso gosto pelo motociclismo e em geral, e pelas HD em particular, nos coloca no mesmo nível.
Portanto, não existe essa diferença.
Ao meu bom e caro amigo Mario, digo que é isso mesmo. Lombos de burros são os detestáveis quebra-molas. Tenho algumas coisas incríveis para contar pessoalmente, se até lá não esquecer. Não podem ser comentadas aquí.
Cadê o Jajá?  Será que o companheirão não vai aparecer por aqui? E outros mais que tenho certeza que estão atrás do toco.
Agora vou mesmo, já são 2:10h.
Até mais.

3 comentários:

  1. Sr.Nemo... ops! Quer dizer Nemo... Não se preocupe com essa coisa de chamá-lo de Sr... Sempre fiz isso, talvez não tenha reparado antes...Trato vários outros assim também, como por exemplo, o Dr. Álvaro, o Sr. João Maurício, é costume meu esse tratamento...

    Bem, quero resgistrar aqui uma reclamação!!! No último post eu acertei o que era a pegadinha - La cobierta - e o Sr. não considerou o acerto !!! Poxa vida ! ha ha ha ...

    Ps: O realismo nos relatos está impressionante, está ótimo...todo dia fico na curiosidade acerca das novidade....

    Na sexta feira à noite, a matéria do Globo Reporter foi exatamente sobre o lugar onde o Sr. estava ! Mostrou boa parte de Mendoza e das estradas com as rochas inclinadas....e fiquei reparando as tais britas....sinistro !!

    Bom, no mais, é isso aí...muito cuidado e boa viagem ! Aguardamos mais notícias!!!

    sds

    maciel

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  2. Amigo Nemo.
    Acho que vou ligar pro fabricante de Gatorade e sugerir patrocínio para você. Se fosse RedBull Já teríamos conseguido.

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  3. Nemo, ler esse post foi como se estivesse rodando com voce. Parabéns pelas palavras e pela aventura !!!!

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